
| 31.07.2007
Aprender um do outro – pensamentos a partir da visão judaica
por Rábi David Rosen
Queria primeiro fazer algumas observações gerais ao “aprender um do outro” com vista a tradições religiosas, antes de me dedicar à responder à pergunta especial à que responder foi solicitado, a saber o que judeus podem aprender de cristãos.
A todos nós está conhecido que dentro das nossas comunidades de fé há tais que não são interessados num diálogo, sim, até estão hostis a ele. Considero isso uma desgraça – reflete em tudo um sentimento de incerteza no contesto mais amplo da cultura humana: Como o experimentei mesmo, o encontro inter-religioso pode ampliar o ângulo espiritual de visão próprio extraordinariamente. Muitos que (para desvantagem própria) recusam o diálogo, estão convencidos de que não haveria, fora das suas tradições, nada que merece ser de aprendido. Então, ainda, há aqueles que temem que o diálogo possa minar o seu credo próprio. Como, no entanto, cada encontro real, viva contém de fato esse “risco” ( o que não necessariamente é algo negativo), penso que o encontro inter-religioso de fato fortalece a confissão daqueles que estão verdadeiramente e ricos em conhecimento ancorados na sua tradição respectiva. Sendo exortado a esclarecer a confissão própria e a articular, o entendimento próprio entendimentos delas está sendo aprofundado.
No entanto, há também um entendimento amplamente
divulgado, até entre praticantes do colóquio
inter-religioso, que impede, por meu ver, um aprender um do outro.
Trata-se da tendência popular de minimizar diferenças
até o ponto em que todas as religiões parecem, no cerne,
fundamentalmente iguais. Em minha opinião, esse ponto de
começar é superficial e, em alguns casos, forma de
arrogância cultural. Em todo o caso, não é ponto de
começar especialmente útil, quando quisermos real e
seriamente aprender um do outro. Naturalmente, podemos perceber que
compartilhamos uma série de princípios importantes dentro
das tradições religiosas diferentes, mas isso não
nos faz iguais a todos!
Quando digo que esse ponto de partida representa uma expressão
de arrogância cultural, quero dizer com isso que afirmar que
fossemos, no cerne, todos iguais, que elevo o meu entendimento
subjetivo próprio de minha tradição de fé
ao critério dum julgamento positivo de valor sobre outros.
Quando, porém, só então estiver em
condição de considerar e respeitar que se assemelharem a
mim, será isso somente sinal para a limitação do
meu horizonte próprio, da minha curiosidade e abertura. Na
realidade, por isso o valor da multifariedade enorme do universo divino
dentro da sociedade humana e das suas formas diversas de
expressão espiritual.
Agora há ainda um outro entendimento, quase diametralmente oposto de diálogo, que predomina em determinados círculos intelectuais e está, por meu ver, pouco útil. Esse ponto de partida está conhecido sob o conceito de pós-modernismo. A mensagem de fundo, paradoxalmente mutatis mutandis foi muitas vezes de pró-modernistas, diz que não haveria nada sobre o que não se pudesse entrar num diálogo, já que, em todo o caso, haveria somente uma única verdade em cuja posse a pessoa mesma estaria!
O ponto de partida pós-moderno declara que cada religião ou cultura seria um sistema completamente fechado que se exprimisse numa linguagem especial e com símbolos próprios. Dentro do total, a significância de palavras e símbolos não poderia ser entendida com outras palavras e símbolos que perfazem o todo do sistema. Daí, um diálogo inter-religioso seria impossível, porque os participantes nunca falassem a mesma linguagem e entendessem as mesmas coisas.
Não considera essa teoria de modo algum como completamente errada, pois certamente muito, no processo da tradução no nível verbal ou cultural, se perde e nos precisamos cuidar nesse respeito de quaisquer tentativas simplificantes. Não obstante, aqueles de nós que estão profundamente engajados no diálogo inter-religioso, recusam essa teoria finalmente do mesmo modo como outrora Benjamin Franklin com as afirmações do bispo Berkley o fez: a experiência nos ensina outra coisa. Cada um que se sinceramente entrou num encontro inter-religioso sabe que podemos aprender um do outro, mesmo se não dispormos sempre da mesma linguagem, terminologia e experiência a fim de entender tudo numa cultura outra e dum modo como isso está sendo entendido dentro dessa cultura.
Como a maioria de vós, também eu posso testemunhar de ter aprendido muito de outras tradições de fé e ter muitas vezes recebido um entendimento da natureza da realidade, que eu e muitos outros nunca tivéssemos ganho dentro da tradição própria. Descobrimos de fato a possibilidade e fizemos a experiência de que a comunicação para além de tais fronteiras é enriquecedora e, com isso, refuta a mera imaginação de que estaríamos destinados a viver de modo exclusivo em sistemas culturais e lingüísticas diversos, sem nós entender poder falar uns com os outros e num modo razoável – uma imaginação que tanto nega que um diálogo tal possa ser tanto enriquecedor quanto negue que entendimento e bem-estar possam ser promovidos no nível global.
Parece-me, para poder realmente aprender uns dos outros, precisamos estar capazes de tanto apreciar a nossa diversidade quanto também aprender dela, não devendo, de um lado, o outro nem simplesmente como igual, nem, de outro lado, afirmar que não haja caminho de chegar com ele realmente em colóquio. Como pessoas de fé, que querem aprender de outras convicções de fé, precisamos ao mesmo tempo humildade teológica como também esperança. A humildade de do conhecimento de que um tradição sozinha não pode compreender a totalidade do divino e a esperança de encontrar o divino até além da tradição própria, dentro da multiplicidade miraculosa e fantástica do universo divino.
Para mim havia, mesmo nos motivos mais fundamentais para o encontro inter-religioso, muita coisa a aprender, nomeadamente ali onde se trata da luta contra bigoteria e mal-interpretação. No esforço de de lutar contra preconceitos e estereótipos também dentro da tradição e comunidade próprias. Pode ser que não sejam da mesma qualidade, mas o encontro os conduz regularmente diante os olhos, como a gente não o percebia antes, possibilitando com isso em seguida uma auto-purificação.
Além do combate a prejuízos e bigoteria há ainda uma dimensão mais alta na colaboração inter-religiosa: a elaboração duma agenda de valores comumente partilhados. No entanto. Cooperação significa não somente que o total é mais que a soma das nossas partes diferentes e uma reflexão à profundeza da nossa confissão sincera a esses valores diversos, mas promove também um entendimento mais profundo no modo de como esses valores dentro da nossa tradição estão sendo interiorizados e expressos.
Além dessas dimensões fundamentais, há uma dimensão mais alta dos nossos encontros religiosos, no entanto naquilo que a nossa Bíblia comum pronuncia na vista à presença divina no mundo. Deus pode ser encontrado na criação, mas antes de tudo na pessoa humana, que foi formada segundo a imagem de Deus. A Bíblia nos ensina que o encontro com o outro representa finalmente um encontro com o divino.
Esse porém é intensivo sem par, quando se trata nisso dum encontro com uma pessoa que, na sua vida própria, experimentou um sentido para o divino e expressa isso. Tais encontros nos oferecem ocasiões de experimentar o divino além da nossa tradição especial – e exatamente isso é que são experiências de aprendizagem religiosa. A significação religiosa de encontros humanos, naturalmente, já foi abundantemente descrita por filósofos de religião como Martin Buber, Emmanuel Levinas, Paul Celan, Jacques Maritain e, naturalmente, o papa João Paulo II.
Em vista a essas observações gerais, judeus têm a aprender muito de cristãos como também de outros. Mas, nomeadamente, temos muito a aprender de cristãos. É verdade, que o Judaísmo não precisa da Cristandade para se entender a si mesmo, plenamente em contrário à Cristandade, que depende de entender o Judaísmo para entender-se a si mesma. Mas isso não significa que judeus não possam aprender nada de cristãos, ou que deixem de, desse modo, pôr em relacionamento com a Cristandade, para poder aprender dela.
No que se refere aos motivos fundamentais para o diálogo – a
luta contra preconceitos e bigoteria – jaz aqui primeiro e
principalmente nos judeus a mostrarem grandeza, apreciar esse processo
notável da Cristandade durante os últimos cinqüenta
anos, de arquivar aquele anti-semitismo e antijudaismo, dos quais a
Cristandade infetada durante milênios, e aprender desse.
Embora seja certamente impossível limpar dos mil anos dentro de
cinqüenta anos plenamente, está, apesar disso,
constatável que essa transformação, essa teshuva,
essa metanoia representa uma das revoluções
ideológicas, senão mais impressionantes, de todos os
tempos.
O que podemos, na minha comunidade, aprender disso, é a
significação e a necessidade de auto-crítica,
mesmo quando essa apontar às partes componentes religiosas mais
íntimas da identidade religiosa e cultural própria – e
até quando houver perigo de que elementos hostis a nós
possam utilizar isso para a nossa desvantagem.
Crítica construtiva numa instituição, numa comuna
ou o que for que seja não é para igualar à
ilegalidade. De fato, pode ser exatamente o contrário.
Crítica construtiva numa instituição, que almeja
mudança positiva, é expressão de mais profunda
fidelidade e veneração referente ao cerne da coisa.
Apesar do todos os perigos não ter medo de crítica nas
ligações próprias é algo que podemos
aprender de alguns amigos cristãos perto de nós desse
tempo moderno.
No que se refere ao segundo nível do diálogo, estaríamos também bem aconselhados para estudar alguns dos nossos modelos com os quais valores éticos, que compartilhamos uns com os outros na base da nossa fonte comum, encontraram entrada no contexto cristão. Não se precisa ir até Calcutá à comunidade da madre Teresa para poder conhecer as formas notáveis de dedicação humana, que estão sendo inspiradas pela fé cristã. A gente as encontra igualmente bem nos nossos vizinhos e no apelo para imitação no contexto no campo ao redor social respectivamente próprio, tento dentro como também além da comunidade própria.
Mas creio que haja perto mais que podemos, não por último, aprender também sobre nós mesmos pelo diálogo cristão-judaico.
O rábi Yitzhak Greenberg descreveu Judaísmo e Cristandade como dois midrashím (apresentações homiléticas) dum texto comum, a saber da Bíblia hebraica. Isso me parece – duma perspectiva judaica – uma fórmula altamente engenhosa para o nosso encontro judaico com a Cristandade.
Um dos aspetos que implica isso, consiste em que deveríamos estar capazes – e como creio devemos – considerar-nos na luz da nossa herança religiosa própria e da nossa doutrina religiosa própria.
Em geral, isso nos era impossível no passado, na base da nossa dor e do fardo da nossa experiência trágica com a Cristandade na história, duma experiência que era alimentada por uma inimizade alimentada com desdém e perseguição, e que nos deteve de ver a doutrina cristã ou até a pessoa histórica de Jesus de Nazaré numa luz positiva. Agora, porque o podemos fazer (pelo menos aqueles entre nós que se sentirem em condição para isso e o quiserem) podemos, não somente reconhecer Jesus de Nazaré como um irmão e professor judaico, mas também reconhecer como os nossos valores e doutrinas fundamentais que muitas vezes, no curso do encontro polêmico com e em concorrência à Cristandade, ficavam cobertos. A ênfase de Jesus de amor e salvação, a disposição de sofrer antes humilhações em vez de acrescentar humilhações, o uso cristão de oração pessoal – todos esses são exemplos para doutrinas e práticas fundamentalmente judaicas, as quais, no entanto, como uso dizer, muitas vezes, em consideração da discussão polêmica com a Cristandade, foram subestimadas. Na medida em que soubermos nos liberar e sarar das cadeias e feridas da perseguição e discussão no passado, nessa medida, como soubermos gozar dos frutos de cooperação e estima mútua, nessa medida poderemos aprender muito da doutrina cristã (embora muitas vezes em contraposição ao comportamento daqueles que afirmam de si serem cristãos) e, com isso, redescubramos, reforcemos e aprofundemos novamente o nosso entendimento próprio e a nossa expressão dessas noções e doutrinas fundamentalmente judaicas.
Indo além de tudo isso, fica a pergunta pelo lugar especial
que a Cristandade deve ocupar dentro da visão do mundo judaica.
Embora o nosso encontro negativo com A Cristandade mesmo não
ajude muito havia , apesar disso, alguns que estavam na
condição de ver a Cristandade numa luz melhor.
Além de Yehudah Halevi e Maimônides (séculos 12 e
13), que consideravam a Cristandade e o Islame como
intermediários de verdades essenciais para a humanidade em
total, e além do rábi Menachem HaMein, que um
século depois considerou a Cristandade e o Islame como
religiões verdadeiras, eruditos como o rábi Moses Rivkes
no século 17 enfatizavam a relação sem par entre
Cristandade e Judaísmo, muito tempo antes de que
filósofos judaicos modernos como Franz Rosenzweig e Martin Buber
o fizeram. A observação deste de que “compartilhamos de
um único livro e duma única esperança” foi por
Ruvkes mais que somente antecipada, quando declarou que judeus e
cristãos estão ligados uns com os outros pela
Bíblia Hebraica e a mensagem desta da salvação,
sua revelação e expectativa do messias. O maio audaz de
todos esses pré-modernos teólogos rabínicos
ortodoxos era, no entanto, possivelmente o eminente rábi Jacob
Emden pelo fim do século 18, o qual a Cristandade descreveu a
Cristandade com a designação derivada da mishna como “knessiyah
leshem shamayim shesota lehitkayim”, como uma comunidade pela
vontade do céu de validade permanecente.
(Na realidade, essa palavra hebraica “knessiyah” é
tradução para “Igreja” – Emden então se refere de
fato à Cristandade como a uma Igreja por vontade do céu,
a qual faz parte da intenção divina para a humanidade
integral).
Mencionado ao lado, o entendimento teológico de Emden da
Cristandade vai muito além das noções como essas
foram articuladas por Dabru Emet, aquela
declaração sobre a Cristandade, que foi de alguns
cientistas americanos-judaicos , assinada por centenas de rabinos e
intelectuais judaicos, foi publicado faz quatro anos e foi recebida
tão positivamente pelos nossos amigos cristãos.
Emden ultrapassa os precursores mencionados enquanto considera a
Cristandade não somente como transmissora de verdades judaicas
no mundo, mas concedendo-lhe um caráter próprio relevante
à salvação. Se isso for o caso, como então
poderíamos entender a relação entre
Judaísmo e Cristandade num modo, no qual o Judaísmo
tivesse algo a ensinar à Cristandade e vice-versa?
Como já enfatizei, essa questão era até há
pouco ainda impensável para a maioria dos judeus, para
não falar em que refletissem sobre ela. Apesar da visão
teológica notável de Emden, a trágica
experiência histórica negativa empurrava para o lado
quaisquer relações íntimas com o próprio
ponto de vista de Emden, para primeiro nem falar dum refletir sobre as
implicações teológicas dele!
Não obstante, os progressos na reconciliação
entre judeus e cristãos durante os últimos cinqüenta
anos contribuíram para abrir uma porta a um entendimento novo da
relação complementar entre a Cristandade e o
Judaísmo, o que nos poderia pôr na situação
de aprender dos nossos amigos cristãos num modo como teria sido
impensável anteriormente. Isso significa, não somente
partir do que há um plano e finalidade divinos na nossa
complementariedade, mas também entender o que Deus quer dizer
com isso!
A tais tentativas de compreender a nossa complementariedade, pertence o
modo de ver de atribuir ao Judaísmo e à Cristandade um
papel paralelo, em que o centro de gravidade judaico jaz na
aliança comunitária com Deus e o centro de gravidade
cristão na relação individual com Deus, e que
esses dois centros de gravidade se mantêm em equilíbrio um
com o outro.
Outros então viam essas complementariedade dessa
relação em que os cristãos precisam da
lembrança judaica de que o reino ode Deus ainda não foi
alcançado completamente, de que esse reino sob vários
aspetos já se tem enraizado no aqui e agora.
Ainda outro modo de ver da complementariedade mútua descreve o
Judaísmo como advertência contínua à
Cristandade dos perigos do triunfalismo, enquanto o caráter
universalista da Cristandade pode jogar um papel essencial para
preservar o Judaísmo duma degeneração a um
isolacionismo insular. Ao contrário à
concepções sub-limiares deste último mencionado,
está a afirmação de que seja exatamente o
universalismo da Cristandade que não se dá bem com o
mundo moderno. O valor de posição alto que, no
Judaísmo, está sendo atribuído à comunidade
autônoma – asseveram – poderia antes servir como modelo para uma
sociedade multicultural, enquanto a Cristandade antes aprontaria uma
resposta melhor à alienação do indivíduo no
mundo moderno.
Esses modos de ver não abrem ao entendimento judaico da doutrina cristã caminho novos, mas também contribuem para o nosso próprio auto-entendimento e para a ampliação do nosso horizonte.
Como resultado queria enfatizar novamente a importância e potencial grande do estudar religioso comum (o que naturalmente, no Judaísmo é um empenho santo – até mais importante que a oração!) completamente no sentido da descrição acima mencionada de Judaísmo e Cristandade por Greenberg como dois midrashim dum texto comum. Embora essas interpretações diferentes contenham posições teológicas que são incompatíveis umas com as outras e marcam a diferença entre as nossas tradições de fé, estamos, se o quisermos então, capazes, exatamente porque se baseiam no texto comumente compartilhado da Bíblia Hebraica, não só de gozar as aclarações mútuas das nossas tradições, mas também de sondar a riqueza sem limites da própria escritura hebraica, junto com uma confissão comumente compartilhada a elas.
Sob esse respeito, queria reproduzir a citação acima mencionada de Martin Buber completamente neste lugar:
“Para vós o Livro e um adro, para nós é o santuário. Mas nesse espaço temos licença de permanecer juntos, juntos ouvir a voz que nele fala. Isso significa que podemos trabalhar juntos no tirar o ter sido falado entulhado desse falar, no resgate da palavra enterrada.”
Texto alemão
